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AMAST

A Necessidade das Mudanças Estruturais

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Não bastarão as passeatas. Para consertar o país, a sociedade precisará forçar mudanças que retomem o poder da população – através de novas leis de iniciativa popular, como a da Ficha Limpa, mas mais profundas – como a aprovação das leis por plebiscitos regulares, exercendo diretamente o poder legislativo – o retomando da corja de parasitas que eleitores despolitizados elegem na falta de candidatos honestos.

A sociedade,Setembro viu as forças conservadoras retomarem terreno agressivamente. O Mensalão volta a preocupar, perpetua-se a impunidade? De novo? A CPI dos Ônibus do Rio empacou e precisa ser recriada, relatada por seu proponente. Um partido representativo sério não consegue se registrar, mas pululam novos partidecos fisiológicos e ainda recebem 600 mil de brinde – e que lambança, as mudanças de filiações. Realmente, só mudando a coisa toda mesmo. Jovens ativistas presos ilegalmente sob acusações estapafúrdias, ao arrepio da lei, sofrem uma paródia jurídica de processo que é uma piada ruim, típica da estupidez de uma ditadura de terceira, conforme Wisnik demonstrou.

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Uma nova lei estadual abertamente inconstitucional criminaliza as manifestações espontâneas – agora é obrigatório as avisar à polícia de antemão – e, ah sim, também é ilegal usar máscaras. Já o assassino da Dorothy Stang foi condenado pela terceira vez, mas não vai mais preso, pois a pena máxima é de trinta anos e ele já cumpriu cinco, ou seja, só roubar galinha (ou se manifestar) dá cadeia.

Há uma série de mudanças estruturais imprescindíveis, que exigirão grande pressão para serem aprovadas e implementadas, pois extinguirão privilégios arcaicos, bem como milhares de péssimos hábitos que existem desde a Colônia, incluindo a doce e tranquila ineficiência do funcionário publico. Como estamos vendo, está havendo e sem dúvida ainda haverá muita reação das elites conservadoras, bem como outras reações, mesmo possivelmente violentas, das máfias.

Sem profundas e estruturais mudanças nas leis e no funcionamento do país, a população terá que permanecer na rua praticamente o tempo todo para garantir os seus direitos. Porém, se essas mudanças estruturais ocorrerem, poderemos ter que sair ás ruas apenas mais esporadicamente, para resolver questões pontuais. Por uma questão de praticidade, assim, a sociedade precisa analisar, determinar e exigir todas as inúmeras mudanças estruturais necessárias para que possamos ter um país decente, moderno e, finalmente, póscolonial.

Os únicos ganhos concretos que foram obtidos após tanto sangue, suor e lágrimas nos protestos foi o descascamento das atividades ilícitas do governador, seu repúdio em massa. E o recuo do aumento, não a redução, das passagens – o que é muito pouco resultado para o esforço todo que foi. A pressão agora terá que continuar, mal se arranhou a superfície, obviamente não vão entregar os privilégios de mão beijada.

 

O que despertou na sociedade foi a exigência da transição para o Estado moderno, ou seja, racional. A razão inclui a lógica, a limpeza, a eficiência e a seriedade que dela derivam. A seriedade permite a competência, que por sua vez permite a abundância.

Este passo moral, que gera a transição para o Estado moderno, foi dado na França durante a Revolução Francesa, na maior parte da Europa nas proclamações das repúblicas nacionais no século XIX e, nos EUA, há cerca de um século na época do muckraking, caracterizado pelo surgimento da imprensa contemporânea local e, na política, pelo combate à corrupção.

O ‘voto consciente’ obviamente faz parte da solução em um sistema democrático, mas além de exigir alguma pesquisa e alguma seriedade por parte do eleitor, o grande problema é a simples falta de candidatos confiáveis em quantidade suficiente. Os cidadãos honestos e idealistas poderão ter que considerar a possibilidade se sacrificarem ao convívio com o lamaçal e se candidatarem, esperando que sua sinceridade seja visível para o eleitor atento.

Porém, só o voto não é o suficiente. As democracias contemporâneas são uma coisa muito mais ‘mão na massa’. O eleitor de muitos países desenvolvidos, na cabine eleitoral, já decide sobre uma longa lista de leis, além dos candidatos. A tendência positiva é isto ser aprofundado, a lista de leis ser votada mais regularmente, trimestralmente, semestralmente ou anualmente, os fóruns em geral terem maior relevância, destaque e visibilidade, ter grandes debates públicos sobre tudo e sobre as propostas de lei. Mas mais do que isso é necessário, a sociedade deve participar regularmente da elaboração de novas leis, ser autora de cada vez mais leis. As mais meritórias, como a da Ficha Limpa, são de autoria popular.

Cada grupo voluntário de interesse poderia se debruçar sobre uma questão, quer do funcionamento, quer da lei, em um setor, analisar e determinar propostas para sua modernização e, geralmente, saneamento. As comissões espontâneas poderiam florescer, levando a uma nova onda de criação de associações e entidades, como logo após a Constituinte e nos anos 90.

Cada grupo pega alguma coisa, todos se apoiam. O que de mais belo havia no anarcosindicalismo eram as greves de solidariedade: as pessoas cruzavam os braços uma pelas outras. Hoje em dia é cada categoria por si. As comissões apresentam as suas propostas e quem se sentir convencido apoia, com boa vontade, com o mesmo apoio mútuo que sustentaram as manifestações, só que em um trabalho mais cotidiano.

Roma não foi feita em um dia, nem estes férteis períodos de transformação histórica duram menos que algumas décadas, é uma obra para toda uma geração. Marina esbarrou na máfia dos cartórios (ou melhor os novos partidecos fisiológicos delas receberam um empurrão – e dos defuntos com firma reconhecida. Há uma máfia atrás da outra nesta república das bananas: arregaçamos as mangas, que o trabalho é longo. A gradual retomada do poder que a sociedade até hoje delegou aos seus representantes é consequência natural do desenvolvimento educacional e tecnológico.